1200 KM!

A viagem era apenas na próxima sexta-feira, mas já na segunda comecei a sentir a ansiedade de mais uma vez ter de deixar minha confortável rotina e cair nas estradas desse Brasil.

Era sempre a mesma coisa: arrumar as malas, fazer um ckecklist de tudo: agendas, processos, reuniões. Dormir em hotéis sem reserva (que mais de uma vez já encontrei barata no quarto), comer em lugares duvidosos, onde nem sempre é possível escolher o cardápio que te agrada.

Sexta-feira chegou. 04 horas da manhã minha carona buzinou em frente de casa. Subi no carro e já fiz a primeira piadinha: “Por que os advogados são enterrados a 14 palmos de profundidade? Porque, no fundo, no fundo, eles são gente boa”. Minha carona deu apenas um leve sorriso amarelo - demonstrando que além de não ter achado nenhuma graça da piada - também não pretendia muita conversa durante a viagem. 1200km com um cara de bom papo já seria um pé no saco.

1200km em silêncio ao lado de um desconhecido - o qual não se importava nem um pouquinho em ser amigável - seria uma experiência difícil de suportar. Lembrei de uma frase de Paul Valéry que dizia: “Há momentos infelizes em que a solidão e o silêncio se tornam meios de liberdade."

Busquei abstrair-me do mundo e tornar a viagem a menos dolorosa possível. Um tempo para mim, refletindo um pouco sobre essa atraente liberdade de estar ao lado de um cara que não se incomodava em andar 1200km sem dizer uma única palavra.

Interessante que a cada quilometro rodado o silêncio  passava a causar menos incomodo e se tornava cada vez mais prazeroso. Observei detalhes na paisagem que jamais daria atenção se estivesse ao lado de alguém bom de lábia disposto a me dar atenção. Percebi ser agradável a experiência de mergulhar dentro da caixinha do nada dentro de mim mesmo.

Pensei em coisas banais, como por exemplo, a possibilidade de mudar a marca do amaciante, já que havia recebido uma reclamação de que minhas camisas sociais estavam dando muito trabalho para passar. Lembrei dos meus pais, esposa, filha, clientes e colegas de trabalho. Fiz um panorama dos últimos anos e de certas decisões que havia tomado na vida. Ponderei minhas atitudes e avaliei que não havia sido um sujeito tão ruim assim.

Mais alguns quilômetros de estrada e minha autoanálise já não era a mesma e percebi um monte de merdas que poderia ter evitado. Procurei justificativas para aliviar a minha própria consciência. Lembrei do provérbio que meu pai sempre repetia a mim e aos meus irmãos: “Justificar um erro é errar outra vez”.

1200Km.

Às vezes certos silêncios são necessários para acalmar os barulhos das nossas almas. Falamos demais, ouvimos demais, argumentamos demais e sentimos demais, quando deveríamos simplesmente parar e observar os caminhos naturais que a vida toma. Precisamos de uma pausa, uma pitada de silêncio para acalmar pelo menos por algum tempo nossas mentes agitadas e os monstros invisíveis que habitam dentro de cada um de nós. 1200km de silêncio, descobertas e reflexão.

MOTIVAÇÃO por Lucas Tobias Advogado, Professor e Escritor. contato@tobiasetobias.com.br